Comentando
Comento o que passa, pode passar, já passou, não passará. Janela virtual que enquadra o espaço, arredonda passagens, embarca o tempo, salta estações, retira bagagem: “Entre as minhas imagens imorredouras estão as janelas. Primeiro, o esforço que fazia na ponta dos pés para ganhar alguns centímetros e ter a linha da vista sobre os balcões. Um ano ou um palmo depois conseguia divisar as estacas limítrofes do nosso quintal, os embuás se enrodilhando na terra, e lagartas esverdeadas sanfonando o corpo no tronco dos mamoeiros. Com os olhos e pelas janelas fiz minhas primeiras excursões. Acompanhava, de longe, a evolução das borboletas amarelas (como nunca mais vi) sobrevoando os quintais; tentava decifrar a forma das nuvens até a vista cansar; navegava em cascas de ingá que desciam nas enxurradas caudalosas junto ao parapeito. Pelas janelas entravam o sorriso do sol diariamente e as broncas das trovoadas de vez em quando. E tinham estranha magia: quando o mundo terminava lá fora, fechavam as janelas. No outro dia, abriam as janelas de novo. E o mundo recomeçava.” ( In Memórias da Liberdade, 1985, Editora Achiamé). Carlos Trigueiro